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Injeção de bactérias geneticamente modificadas ataca tumores em teste

14/08/2014

Injetar bactérias geneticamente modificadas num tumor que já resistiu a vários tratamentos não parece a mais lógica das abordagens, mas foi o que fizeram cientistas nos EUA - e com um grau considerável de sucesso.

 

Ocorre que os micróbios são capazes de, ao mesmo tempo, "comer" pedaços do tumor e evitar danos aos tecidos saudáveis do paciente, mostra a pesquisa publicada na edição desta semana da revista especializada "Science Translational Medicine".

 

Os resultados, ainda muito preliminares, apesar de encorajadores, foram obtidos em testes com ratos, cães e com uma única paciente humana -outras pessoas devem participar dos ensaios clínicos em breve.

 

"Ainda estamos na fase 1 dos testes clínicos, cujo objetivo é verificar apenas se a terapia é segura. Ainda não temos como comparar essa abordagem com outros tratamentos contra o câncer, e é cedo para dizer quais tumores seriam mais vulneráveis a ela", disse o médico Saurabh Saha, da empresa de biotecnologia BioMed Valley Discoveries. A firma pretende transformar as descobertas em produtos caso tudo corra bem.

 

SEM AR - Saha e seus colegas desenvolveram sua própria variedade, ou cepa, da bactéria Clostridium novyi, que pode causar infecções graves em pessoas e animais.

 

A questão, porém, é que se trata de um micróbio anaeróbico, ou seja, que precisa de um ambiente pobre em oxigênio para se multiplicar. Foi isso que levou os cientistas a pensarem nela como arma.

 

É que o crescimento desordenado dos tumores faz com que, no interior deles, surjam regiões cheias de células com baixo suprimento de oxigênio -células que, aliás, são resistentes à quimioterapia ou à radioterapia. Surgiu, portanto, a ideia de enviar a C. novyi a essas áreas.

 

Antes disso, porém, os cientistas "deletaram" parte do DNA da bactéria, um gene que normalmente permite que o micróbio produza uma toxina bastante agressiva.

 

As bactérias foram então injetadas diretamente nos tumores - primeiro em ratos com uma forma artificial e agressiva de câncer cerebral, depois em cães que tinham desenvolvido naturalmente a doença e, finalmente, em uma mulher de 53 anos com um tipo de câncer muscular, já em fase de metástase (espalhamento pelo organismo).

 

A abordagem dobrou a expectativa de vida dos ratos e eliminou ou reduziu bastante o tumor em 40% dos cães. O tumor no ombro da paciente humana também ficou praticamente destruído, sem células viáveis sobreviventes.

 

"Até onde sabemos, o mais importante para esse sucesso foi a injeção direta da bactéria no tumor e a preferência dela por ambientes com pouco oxigênio", explica Saha. Com isso, o micróbio atacou apenas a massa de células no interior do tumor.

 

Houve efeitos colaterais em todos os casos, os quais lembram muito uma infecção tradicional: inchaço, dor e febre. "Quando a bactéria conclui seu trabalho, podemos controlá-la com antibióticos tradicionais", diz o médico.

 

Para o biólogo Tiago Góss dos Santos, pesquisador do A.C. Camargo Cancer Center, os resultados parecem promissores, em especial por se tratar de um trabalho inicial.

 

"É preciso levar em conta o fato de que os tumores são muito heterogêneos, então é normal que uma única estratégia não consiga destruí-los totalmente", explica. "A bactéria poderia ser uma arma para reduzir o tamanho deles, sendo combinada a outras terapias que atacariam as células tumorais que não estão sob essa condição de baixo nível de oxigênio."