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Microcefalia por zika vai além do cérebro pequeno

03/02/2016

Com aumento de bebês com microcefalia, o debate sobre o direito ao aborto foi reacendido. De um lado, um grupo articula o ingresso de uma ação no STF (Supremo Tribunal Federal) pedindo, entre outras coisas, que a mulher tenha direito ao aborto nesses casos.

 

Do outro, grupos antiaborto e de familiares de pessoas que vivem com microcefalia defendem que as crianças devam ter direito à vida. Um caso emblemático que tem aparecido na imprensa é o da jornalista Ana Carolina Cáceres, 24, que nasceu com microcefalia, passou por cirurgias e hoje leva uma vida normal.

 

A questão é que há muitas diferenças entre os casos clássicos de microcefalia, uma malformação cerebral em que o perímetro do cérebro do bebê seja menor que o normal, e esse conjunto de lesões que vem sendo observados na "microcefalia" associada ao vírus zika.

 

Tanto que já se fala em uma mudança de nome: "síndrome fetal do zika", que definiria melhor esses casos. Um artigo publicado pelo Centro de Controle de Doenças dos EUA (CDC) fez uma avaliação das características da microcefalia associada especificamente ao vírus zika, baseada em 35 bebês brasileiros.

 

De acordo com o trabalho, em 71% dos casos, as lesões cerebrais eram severas, com comprometimento físico e mental, ou seja, vão muito além de um perímetro cerebral menor. Cerca de um terço das crianças nasceu com excesso de pele no crânio, o que demonstra que o feto sofreu um estresse ainda no útero da mãe que interrompeu o seu desenvolvimento normal.

 

Os pesquisadores também relatam uma doença articular (artrogripose), pé-torto e problemas oftalmológicos graves. Entre os 27 bebês que passaram por exames de neuroimagem, todos apresentaram alterações como calcificações, alargamento dos ventrículos (cavidades do cérebro) e alteração no padrão de migração dos neurônios (importantes para a adequada formação do cérebro).

 

Ainda é muito cedo para previsões de qualquer ordem. Só o tempo, o acompanhamento e os cuidados necessários para com esses bebês é que vão possibilitar um retrato real das suas potencialidades futuras. Portanto, aqui não cabe ainda qualquer comparação com os casos clássicos de microcefalia.

 

É bem provável que a maioria dos bebês com a "síndrome do zika" vá sobreviver, ainda que com sérias limitações, o que inviabilizaria eventuais autorizações judiciais por analogia à permissão do aborto em casos de anencefalia ou outras malformações incompatíveis com a vida.

 

Na ação que em breve chegará ao STF, o argumento será o de que a mulher não deve ser punida (em ser obrigada a ter um filho com lesões graves) por uma falha das autoridades em controlar o mosquito transmissor do zika.

 

Na falta de respostas básicas para o caos sanitário instalado no país (tais como: qual o número de casos de zika no país? quantos casos confirmados de microcefalia associados ao vírus?), na vida real, as mulheres infectadas por zika, com boas condições financeiras, já estão tomando suas decisões e recorrendo ao aborto antes mesmo de confirmar a microcefalia. Outras abortam já com o diagnóstico da microcefalia.

 

O problema é que esse diagnóstico está sendo feito tardiamente, só por volta 28ª semana de gestação. Nessa altura, o que ocorre é um feticídio. Aplica-se se uma injeção de cloreto de potássio no coração, o feto morre e, em seguida, o parto é induzido.

 

Não é uma decisão fácil para a mulher em nenhuma situação. Recorrer ao aborto clandestino ou assumir uma criança com eventuais sequelas graves são opções igualmente difíceis. A sociedade brasileira, porém, "endeusa" a mulher que mantém a gravidez de um feto malformado e demoniza a que opta pelo aborto.

 

Em outros países, a situação é bem diferente. Na Polinésia Francesa, por exemplo, que registrou uma epidemia de zika anos atrás, as autoridades de saúde nem perceberam o aumento de malformações cerebrais porque, diante dessa situação, muitas mulheres abortaram. Em vários países, como a Grã-Bretanha, o aborto é permitido até a 24ª semana de gestação e os motivos não são sequer questionados. No site do programa "Newsnight", diante da discussão sobre a proibição do aborto no Brasil, um britânico comentou: "Meu Deus, eles ainda estão discutindo o direito da mulher escolher?"

 

Neste momento de tantas informações desencontradas, o mínimo que essas grávidas brasileiras infectadas por zika precisam é de amparo psicológico, assistência médica adequada e acesso a informações corretas. Porém, a principal dúvida, quais os reais riscos de o seu bebê desenvolver microcefalia, seguirá sem resposta.



Fonte: Folha de S. Paulo | Portal da Enfermagem
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