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Drauzio Varella recebe prêmio por sua trajetória e contribuição à oncologia

05/08/2019

Foi em 1974, sete anos após se formar em medicina pela USP (Universidade de São Paulo), que a oncologia atraiu definitivamente o médico Drauzio Varella. Depois de tratar um paciente com câncer de pele melanoma com o bacilo de Calmette-Guerin, usado nas vacinas contra tuberculose (BCG), surpreendeu-se com os resultados.

 

“Fui documentando com biópsias e fotografias a evolução. O paciente já tinha indicação de amputação do braço por conta das lesões e apresentou regressão espantosa. Todas as lesões desapareceram. Fiquei encantado”, conta.

 

À época, dividia o seu tempo trabalhando com o professor Vicente Amato Neto, no Hospital do Servidor Público de São Paulo, e com a atuação no antigo Hospital do Câncer (hoje A.C. Camargo Cancer Center), onde aprendeu na prática a tratar pacientes com os mais diversos tipos de tumores. Na instituição, dirigiu o serviço de imunologia por 20 anos. “Não havia especialização ou pós-graduação em oncologia. Havia cirurgiões maravilhosos. Fui aprendendo vendo os doentes, lendo sobre o assunto, estudando o que estava sendo feito no exterior.”

 

Em 1978, fez um estágio no MD Anderson, centro oncológico nos Estados Unidos que é referência mundial. De 1990 a 1992, chefiou o serviço de câncer no Hospital do Ipiranga, na época pertencente ao Inamps (Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social).

 

Nos anos 1980, foi um dos pioneiros do país no tratamento da Aids, especialmente do sarcoma de Kaposi (tipo de câncer comum em imunodeprimidos).  Em 1986, começou a fazer boletins sobre saúde em emissoras de rádio —primeiro sobre prevenção ao HIV, um assunto novo na época, e depois sobre outros assuntos.

 

Da rádio passou para a TV. Hoje tem site de informações médicas e canal no YouTube e assina coluna quinzenal na Folha. Tornou-se a maior referência de divulgação de saúde no país. E continua atendendo pacientes com câncer em seu consultório na Bela Vista, em São Paulo.

 

Por toda a sua contribuição à oncologia, Drauzio Varella, 76, é o vencedor do 10º Prêmio Octavio Frias de Oliveira na categoria Personalidade de Destaque. A cerimônia de entrega será nesta segunda-feira (5), às 19h30, no teatro da Faculdade de Medicina da USP. Na ocasião serão revelados os vencedores das outras duas categorias do prêmio.

 

Em Pesquisa em Oncologia, concorrem três finalistas: Adriana Franco Paes Leme, autora de um estudo que buscou definir a agressividade de tumores de boca; Andrew Maltez Thomas, cuja pesquisa indicou uma forma de diagnosticar o câncer colorretal por meio da análise da microbiota intestinal; e Carlos Wagner de Souza Wanderley, autor de uma análise dos efeitos do quimioterápico paclitaxel que pode ajudar a aumentar sua eficácia.

 

Na categoria Inovação Tecnológica em Oncologia, concorrem Claudia do Ó Pessoa, que criou uma substância análoga a um composto retirado do ipê com potencial contra o câncer e baixa toxicidade; Luciana Facchinetti de Castro Girão, que obteve uma nova formulação do medicamento asparaginase, para leucemia, com menos efeitos colaterais; e Natalia Mayumi Inada, que criou uma técnica óptica que ajuda o médico a diferenciar queratoses seborreicas pigmentadas de câncer de pele do tipo melanoma.

 

A premiação é uma iniciativa do Icesp (Instituto do Câncer do Estado de São Paulo Octavio Frias de Oliveira), em parceria com o Grupo Folha. A láurea, que leva o nome do então publisher da Folha, morto em 2007, busca reconhecer e estimular contribuições na área oncológica.

 

Para cada categoria, a premiação é de R$ 20 mil. Os vencedores são apontados por uma comissão composta por representantes do Icesp, da Faculdade de Medicina da USP, do Hospital das Clínicas da USP, da Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), da Academia Nacional de Medicina, da Academia Brasileira de Ciências, do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), da Fundação Oncocentro de São Paulo e da Folha.

 

O vencedor na categoria Personalidade de Destaque, porém, rejeita o termo oncologista e se autodeclara cancerologista. “Havia muito preconceito com a palavra câncer, mas eu acho que, se eu trato doentes com câncer, eu sou cancerologista. Oncologista era um disfarce que depois virou nome da carreira”, diz ele.

 

Varella considera que o grande impacto em sua área de atuação dessas últimas cinco décadas tenha sido o desenvolvimento do pensamento científico a partir de estudos controlados feitos em diversas partes do mundo. “Antes você definia condutas baseadas em ideias de professores influentes. A cirurgia de Halsted [William, criador da mastectomia radical] ficou imposta por mais de cem anos. Não importava se o tumor tinha 0,5 cm ou 10 cm, a mutilação da mulher era a mesma, baseada na fama que ele tinha, em zero evidência.”

 

Halsted defendia que, quanto mais abrangente a cirurgia de câncer de mama, maiores seriam as possibilidades de cura. Só a partir dos anos de 1980, com os estudos de Bernard Fisher, concluiu-se que o câncer de mama era uma doença sistêmica e que era possível tratá-la com cirurgia menos invasiva (tumorectomia), radioterapia e quimioterapia.

 

Nessas últimas cinco décadas, Varella acompanhou o avanço em tratamentos de muitos tumores que antes eram fatais. “Vi muita gente morrer de câncer de testículo que, mais tarde, a gente passou a curar. A gente curava 20% dos casos de leucemia nas crianças e agora inverteu, curamos 80%.” No entanto, ainda persistem os desafios para alguns tipos de câncer, como o de pâncreas. “Não temos um prognóstico muito melhor do que há 30 ou 40 anos.”

 

Diagnósticos tardios também são obstáculos. “Uma célula normal sofre determinada mutação e vai se multiplicando. Em algumas situações, o diagnóstico só vai acontecer quando o tumor tiver 3 cm, 4 cm. Até chegar nessa fase, passaram-se anos. Estamos diagnosticando em fases muito avançadas e aí fica tudo mais complexo.”

 

A desigualdade no acesso a tratamentos oncológicos é uma das suas maiores tristezas. “Não conseguimos levar os grandes avanços à população. Você pode ter uma paciente do SUS, saber que existe tratamento que poderia beneficiá-la, mas não consegue pagar por ele. E vai ser assim cada vez mais.”


Ao mesmo tempo, o médico questiona os custos dos novos tratamentos, como a imunoterapia. “São imorais, impagáveis. O justo seria que as farmacêuticas calculassem o que foi gasto no desenvolvimento da droga e de outras que não chegaram ao mercado e qual o lucro necessário para investir em novas moléculas.”

 

Mas hoje, segundo ele, o cálculo é feito em cima do quanto as companhias de seguro de saúde norte-americanas aceitam pagar por essa droga. “Se elas topam pagar US$ 10 mil, US$ 15 mil, US$ 20 mil, é isso que vai custar. Há um lobby poderoso em torno disso tudo.”

 

E como o doutor Drauzio lida com a morte de seus pacientes? “A gente não cura muitas doenças, como o diabetes, mas procura dar às pessoas a melhor qualidade de vida e evitar complicações e sofrimento. É a mesma coisa com a morte. O processo deve ser natural, sem dor, para que a pessoa morra em paz.”

 

Ele diz sentir tanta realização pessoal nesse tipo de desfecho quanto quando cura um doente. “Curar é ótimo, tudo é festa. Mas quando encontro alguém que me diz: ‘o senhor cuidou do meu avô, ele veio a falecer, mas foi tão bem, tão tranquilo’, recebo como um elogio até maior, porque não tem festa. É simplesmente a morte, e nós temos que lidar com ela e aceitá-la. Essa é a essência da medicina, aliviar o sofrimento humano. Para isso é que existe a profissão.”

 

Prêmio Octavio Frias de Oliveira - Segunda-feira (5), no teatro da Faculdade de Medicina da USP (av. Dr. Arnaldo, 455, São Paulo)



Fonte: Folha de S. Paulo | Portal da Enfermagem
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