São Paulo, 20 de abril de 2024
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Registro de Enfermagem

Mirela Bertoli Passador
Enfermeira, Fiscal do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP)
[email protected]

21/11/2011

Comunicação é troca de informação e na área de saúde essa ferramenta torna-se instrumento facilitador da assistência, garantindo ao paciente a continuidade de seu cuidado. Nesta questão, o Registro de Enfermagem, que contempla informações subjetivas e objetivas do paciente, constitui-se em um dos mais importantes indicadores da qualidade prestada, afinal, informação não registrada é informação perdida.

 

Além de contemplar as informações sobre a assistência, o Registro de Enfermagem permite a continuidade do planejamento dos cuidados de Enfermagem nas diferentes fases, inclusive para o planejamento assistencial da equipe multiprofissional. Ele também é um documento legal de defesa dos seus profissionais e subsidia elementos para a pesquisa e informações nos âmbitos administrativo e clínico para a auditoria em Enfermagem.

 

A enfermeira Mirela Bertoli Passador, fiscal do Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo (Coren-SP), fala ao Portal da Enfermagem sobre as questões fundamentais que precedem o Registro de Enfermagem, ou seja, o que anotar; quando anotar; onde anotar; como anotar, para que anotar e quem deve anotar. Ela também aborda os aspectos legais dos registros de enfermagem e, inclusive, como eles devem ser constituídos para serem considerados autênticos e válidos legalmente.

 

E você pode enriquecer ainda mais este material. Se você tiver sugestões para um bom registro de enfermagem, faça seu comentário.

Boa leitura!

 

 

Como podemos definir Registro de Enfermagem?
Por registro de enfermagem entendemos ser a documentação de todo o processo de cuidado de enfermagem. Através deles nos comunicamos com os demais membros da equipe de saúde, além da equipe de enfermagem; respaldamos-nos legalmente, assim como promovemos respaldo, também, à instituição e ao paciente; disponibilizamos dados primordiais para avaliação do estado geral do paciente, utilizados por toda equipe de saúde, para implementação de assistência integral e holística; além de fornecer informações importantes para construção de indicadores de qualidade de assistência e subsidiar ações de pesquisa e ensino.



Como é dividido o Registro de Enfermagem?
As etapas seguidas para documentação do cuidado realizado pela equipe de enfermagem a um determinado paciente em seu prontuário, via de regra, e por força de normatização realizada pelo Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), a Resolução Cofen 358/09, que seguem as etapas do Processo de Enfermagem (coletas de dados de enfermagem ou histórico de enfermagem, diagnóstico de enfermagem, prescrição de enfermagem, evolução/avaliação de enfermagem e anotações de enfermagem).

 

Para um bom registro existe sequência recomendada?
Os registros devem ser realizados com letra legível, sem rasuras, de forma clara, objetiva e completa, identificado com data e horário e com carimbo (contendo nome completo, número de inscrição/autorização no Coren e categoria profissional) e assinatura ao final - Resolução Cofen nº 191/96, e no estado de São Paulo temos a Decisão Coren-SP/DIR/001/2000. Como as informações registradas em prontuário são oficias, para a manutenção de seu valor legal não deverá apresentar rasuras. No caso de erro ou equívoco nas informações registradas, as palavras inadequadas deverão ser colocadas ente parênteses, com a palavra "digo" entre vírgulas, após os parênteses e registro das informações corretas.

 

 

Existe um roteiro que poderíamos sugerir do que deve ser registrado?

Não. Porque isso vai depender da normalização adotada pela instituição e das características individuas de cada paciente, que serão levantadas pelo enfermeiro, e os cuidados prescritos por meio da aplicação do Processo de Enfermagem. Vale ressaltar que toda a ação que envolve a assistência deve ser registrada, como exemplo, as prescrições de enfermagem e médicas cumpridas, os cuidados de rotina, as medidas de segurança adotadas, os encaminhamentos ou transferências de setor. No que se refere a sinais e sintomas, registrar os identificados através da simples observação e os referidos pelo paciente. E, claro, as intercorrências, que incluem os fatos ocorridos com o paciente e as medidas adotadas. Para finalizar, é preciso registrar as respostas dos pacientes às ações realizadas.

 

“toda a ação que envolve a assistência deve ser registrada”

 


normatização do Sistema Cofen/Coren sobre o assunto?
Sim, além da Resolução Cofen 191/96, que trata da forma de anotação e o uso do número de inscrição ou da autorização pelo pessoal de Enfermagem, há a Resolução e 358/09, que dispõe sobre a Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE), ainda existem os diversos artigos que compõem o Código de Ética dos Profissionais de Enfermagem (Resolução Cofen nº 311/07). Vale ressaltar também que encontramos a legislação aplicável ao assunto no artigo 368 do Código do Processo Civil (CPC).



A falta de registro adequado pode trazer algum risco ao paciente?
Sim, a falta ou o registro incompleto de informações sobre os cuidados
prestados ao paciente podem gerar inúmeros riscos, sendo a "comunicação
efetiva" elencada como um dos 10 passos principais a serem seguidos para a
segurança do paciente, que diz: “A comunicação efetiva é uma ferramenta essencial para a segurança do paciente – registre e transmita as informações sobre o paciente”.

Algumas instituições utilizam registrar alguns parâmetros em formulários ou cadernos específicos. Mas esta prática não é correta, pois este documento não irá acompanhar o prontuário do paciente, ou seja, qualquer informação relativa à terapêutica do paciente deve estar registrada no seu prontuário. Em minha experiência enquanto fiscal não verifiquei essa ação como rotina nas instituições em que tive contato.


E ao profissional? Quais as consequências éticas e legais?

No caso de um profissional de enfermagem ser acusado por algum ato inadequado, seja decorrente de imperícia, imprudência ou negligência, as ações registradas no prontuário do paciente atendido serão seu respaldo legal, sendo utilizadas tanto em sindicâncias/processos administrativos - realizados pela instituição empregadora, avaliação e/ou processo ético - realizado pelo Coren; bem como em processos cíveis (indenizatórios) e criminais.


Um registro inadequado também impacta em glosas por parte dos convênios. O que a senhora teria a dizer sobre isso?

Com certeza. Um cuidado prestado e não registrado, ou registrado de forma incompleta, ou ainda, sem identificação correta do profissional que o realizou, poderá gerar dúvida com realização a sua real execução e, consequentemente, na utilização dos materiais/equipamentos relacionados, sendo motivo de duvida e possível glosa por parte dos convênios.

 

“Um cuidado registrado de forma incompleta, ou ainda, sem identificação correta do profissional que o realizou, poderá gerar dúvida com realização a sua real execução”

 

 

Existe um "paradigma" na enfermagem que o plantão diurno utiliza caneta com tinta azul e noturno, vermelha. Existe algum convencionado?

Não existem normas legais sobre o assunto. Cabe a cada serviço de saúde, administrativamente, definir a questão. Particularmente, acredito que a diferenciação entre cores de caneta para registro das ações de enfermagem desenvolvidas nos plantões (diurno e noturno) facilita diversas atividades gerenciais, como, por exemplo, a supervisão dos registros pelos enfermeiros coordenadores/supervisores de plantão e as ações da equipe de auditoria de prontuários.

 

 

Recomenda-se que a equipe faça uso de termos científicos em seus registros. Quais estratégias os líderes podem adotar para facilitar esta prática?

A utilização de terminologia científica deve ser incentivada, com trabalho contínuo dos enfermeiros responsáveis pela educação continuada ou permanente, em parceria com os enfermeiros supervisores/coordenadores e assistências. A confecção de guias, cartilhas, folhetos descritos auxiliam, porém não garante a efetividade da ação. Em diversos anos de visita aos mais variados serviços de saúde oferecidos a população e prestados pela equipe de enfermagem, constatei, nesta questão, a utilização da estratégia "estudo de caso" (onde enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem se reúnem, quinzenalmente, para apresentação e discussão de um caso atendido no mês anterior. A discussão acontece com a análise dos registros de enfermagem realizados em prontuário, onde a equipe analisa seu conteúdo e se o cuidado prestado foi adequadamente registrado, incluindo a utilização de terminologia) como medida eficaz para o desenvolvimento e aprendizado da equipe. Para efeito de exemplo, me lembro que em uma instituição de saúde que atuei, implantei um manual de terminologias e mapas identificando as regiões do corpo que ficavam no Posto de Enfermagem para consulta da equipe, o que foi muito positivo.

 

 

Há situações em que a ação de Enfermagem, por uma série de motivos, não foi registrada em prescrição pelo enfermeiro ou médico. Nesse caso, como a senhora orienta a equipe de nível médio quanto ao registro?

Todas as ações de enfermagem desenvolvidas por técnicos e auxiliares de enfermagem, por força da Lei nº 7.498/86, devem estar prescritas e devem ser supervisionadas por Enfermeiro. Desta forma, os profissionais de nível médio de enfermagem (técnicos e auxiliares) não devem desenvolver nenhuma atividade que não esteja prescrita: diretamente em prontuário ou definida como rotina em documentos formais de cada serviço. Ainda, a Resolução Cofen nº 225/00 determina que seja vedado ao profissional de Enfermagem aceitar, praticar, cumprir ou executar prescrições medicamentosas/  terapêuticas, oriundas de qualquer profissional da área de Saúde, por meio de rádio, telefonia ou meios eletrônicos, onde não conste a assinatura deles, sendo consideradas exceções situações de urgência, na qual, efetivamente, haja iminente e grave risco de vida do cliente.

 

 

Como deve ser utilizado o livro de intercorrências? Quais anotações devem ser registradas? Existe algum tempo para ele ser arquivado?

O livro de intercorrências deve ser utilizado em situações nas quais a equipe deseja registrar algum fato que possa comprometer o processo de trabalho. Por exemplo, o atraso na entrega de roupas. Nunca deverá ser utilizado para registrar ações que envolvam o cuidar, como queda no leito. Informações relativas à terapêutica devem ser obrigatoriamente registradas no Prontuário do Paciente. Vale ressaltar que em algumas situações o livro também funciona como protocolo de entrega de exames após a alta. E enfatizo que data, horário, exames entregues e nome do profissional responsável também devem ser registrados no Prontuário. Em linhas gerais, todas as atividades assistências, de cuidado direto ao paciente, devem ser registradas em prontuário, obrigatoriamente. As ações administrativas/gerencias - falta de funcionário, falta ou quebra de equipamentos, necessidade de manutenção ou consertos em geral - em livro de intercorrência (comumente chamado de "livro preto"). O seu tempo de arquivamento vai depender da normatização estabelecida pela Instituição, e neste caso sugiro uma consulta ao Departamento Jurídico da mesma. 

 

 

A senhora participou da construção da Cartilha de Anotações de Enfermagem, iniciativa do Coren-SP. O que a motivou trabalhar no processo?
Na atual, aceitei o convite para realizar a revisão da cartilha. Os registros de enfermagem, em especial a realização de anotações dos cuidados de enfermagem prestados é assunto que ainda gera uma série de dúvidas entre todos os profissionais da equipe de enfermagem. Enquanto fiscal do Coren-SP há mais de dez anos, tenho acompanhado diversas situações que culminam em prejuízo monetário aos profissionais, serviços de saúde e pacientes, além de implicações ético-profissionais as equipes de enfermagem, pela ausência/deficiência dos registros realizados. Progredimos bastante nesta questão, principalmente a partir do ano de 2002, quando o Cofen promulgou a Resolução 272/02, revogada pela Resolução 358/09, porém, temos ainda um grande caminho para percorrer até alcançarmos padrões de excelência neste quesito.


A quem e como a Cartilha é distribuída?

Ela está disponível para consulta e download, no site do Coren, a todos
os interessados. Sua edição impressa é distribuída a profissionais e
estudantes de enfermagem, em eventos promovidos pelo Conselho ou através
de solicitações formais realizadas por serviços de saúde ou instituições
de ensino.


Como está a questão do prontuário eletrônico? Como fica o registro/anotação de Enfermagem neste processo?

O Cofen firmou parceira com a SBIS (Sociedade Brasileira de Informática em Saúde) para normatizar o assunto. Atualmente, os prontuários eletrônicos certificados (atendem a uma série de requisito, como: validação de assinatura eletrônica, termo de consentimento prévio do paciente, entre outros) possuem respaldo legal, não sendo necessária outra forma de armazenamento de dados. Caso contrário, devem ser convertidos em meio físico para assinatura de todos os profissionais envolvidos no processo.

 

 

Clique aqui e faça download da Cartilha de Anotações.

 

Passador M. Portal da Enfermagem – Registro de Enfermagem [internet] 2011 [citado 2011 Novembro 19]. Disponível em http://www.portaldaenfermagem.com.br .